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Foto do escritorJuliana Galvão

"Nós somos o futuro" - Vanity Fair (10/2018)


"Nós somos o futuro"

"Não deixamos que ninguém nos imponha nada, somos brutais. Demos muito mais tapas do que levamos.


“Todos nos esperam no portão? E nós esperamos por eles. Vejamos se seremos meteoros.”



Måneskin - O lado bom da vida

Lançado o álbum de estreia e a banda rock fenômeno do momento conta como nasceu “o seu primeiro filho”. Entre noites criativas, avances de fãs e comida saudável, é o momento de deixar uma marca. Em total liberdade.


Damiano descobre o peito. Na pele há uma tatuagem com o título do esperadíssimo álbum de estreia do Måneskin, sua banda, “Il Ballo Della Vita”, que será lançado no dia 26 de outubro.


Uma jogada arriscada, é quase como tatuar o nome de uma namorada, eu ressalto.

“Não tem nada, para mim esse disco é um filho, e um filho se ama para sempre”, diz.

Os seus três companheiros de nomes exóticos - Victoria, Thomas e Ethan – fazem que sim com a cabeça, mas eles não fizeram a tatuagem.

Damiano é o vocalista, tem 19 anos, é o mais velho do grupo. Parou de estudar e é rockstar a pouco tempo. É meio que o porta-voz, aquele que fala primeiro e mais que todos e dita a linha da comunicação do Måneskin.

Eles se sentaram à mesa, acabaram de posar para um ensaio fotográfico com Max Vadukul. Alguém já explicou a eles que Max é um grande nome da fotografia, e eles ficaram honrados: “Loucura. Ele fotografou todos os grandes artistas. De Mick Jagger a Amy Winehouse...”

Mas vocês gostam de se vestir, maquiar e fotografar?

“Sim, desde que possamos decidir. As roupas, a maquiagem, qualquer coisa”

Victoria, com a franja nova, é mais conciliadora: “Somos muito ligados à imagem. Nos expressamos dessa forma”.


E esse é um dos diferenciais do Måneskin: a autonomia. Sempre tiram tempo para sublinhar que ninguém os forçou ou induziu a fazer nada, que fazem tudo por si mesmos. Por exemplo, esse primeiro album: a prova de fogo.

“Todo mundo está esperando vocês no portão, sabiam?”

“E nós estamos esperando por eles: veremos se somos meteoros”, Damiano corta rapidamente, com ar desafiador, como quem diz: agora vocês irão nos ver.

Aqui está o outro diferencial: a segurança no limite da arrogância.

Quem os viu no The X-Factor conhece e aprecia essa atitude muito jovem e muito rock, mas antes da televisão houve a experiência na rua, mais precisamente na Via del Corso, em Roma. O início da história se perde na névoa do mito, mesmo que estejamos falando de apenas três anos atrás, 2015. Sobre o dinheiro ganho naquelas exibições, recolhidos em uma latinha deixada no chão, existem lembranças diferentes: “100 euros por hora”. “Não, 60”. “Não, 100 por dia.”

E depois chegam a um acordo: “De qualquer maneira, nos saíamos bem, conseguimos pagar o master de "Chosen" (o single): fomos ao estúdio com tudo pronto e o cara não conseguia acreditar... parecíamos quatro fugitivos de casa”


Detalhes já contados na história (Thomas: “Um dia eu machuquei a mão, a guitarra estava toda suja de sangue. Não tínhamos equipamento ainda, então tínhamos que tocar muito forte. Voltávamos para casa com todos os instrumentos nas costas no ônibus”) e também um pouco de auto-ironia: “Tinha até certos malucos que nos davam 20 euros! Geralmente eram turistas”.


E depois a fase dinamarquesa, ou seja, os dois shows na Dinamarca em 2016, ponto de virada, sobretudo interior: “Ali entendemos que podíamos levar isso a sério”, conta Thomas.

Em 2017, chegam ao The X-Factor, o talent show que os lançou para fora das divisas do quarteirão de Monteverde de Roma. O The X-Factor, do qual o Måneskin é vencedor moral (o verdadeiro vencedor é Lorenzo Licitra), faz com que eles se tornem o novo fenômeno musical-midiático do ano, entre capas de jornais, sessões de autógrafos, shows esgotados, fãs em delírio, os números (por exemplo, 56 milhões de visitas no YouTube e 72 milhões de streams no Spotify) e os reconhecimentos (entre outros, o duplo disco de platina por Chosen).


E aqui estamos hoje com Il Ballo Della Vita, o álbum de estreia, que sai por uma gravadora: A Sony. Doze músicas: cinco em inglês, sete em italiano. A gênese do disco, retratada no documentário “This Is Måneskin” é o sonho de qualquer jovem que queira viver de música.


Victoria explica: “No verão passado nos trancamos por um mês em uma casa de férias próxima a Milão para escrever o disco. Conseguimos dar descanso a todas as coisas que tinhamos acumulado durante o último ano”.


O processo criativo “foi absurdo”, segundo Thomas. Que dá um exemplo: “Às vezes eu acordava as 3 e meia da noite com uma ideia e o estúdio estava logo ali em baixo, podíamos experimentar com liberdade”.


A autogestão não foi apenas criativa: eles mesmos cozinhavam, especialmente Damiano.

É um bom chef?

“Faço coisas normais: pratos de massa, purê de batata”

Agora ele é modesto, mas Victoria conta que, na Dinamarca, “se mostrava, se gabava com seu purê”, mas na verdade “era terrível, com as batatas cruas em pedaços”.

Mas afinal, como foi com a Sony? Quem foi proposto como produtor? A resposta é, mais uma vez, o sonho de qualquer jovem que queira viver de música: carta branca.

“Fizemos aquilo que queríamos”, Damiano resume de forma eficaz, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Não é óbvio que a Sony dê o máximo de liberdade a uma banda de jovens, tento contestar.

“Sim, é verdade. A confiança que eles nos deram foi o que nos fez querer dar o nosso máximo”, mas depois especifica: «Não deixamos que ninguém nos imponha nada: senão não vale a pena. Nós somos assim e se você quiser nos levar, leve assim. Ainda na época do The X-Factor, antes de começar, já tínhamos dito que se quisessem cortar nossos cabelos iriamos para casa”.

Talvez se refiram ao caso Farias? (Os garotos indígenas que cortaram os cabelos durante o The X-Factor de 2009, entre milhares de polêmicas).

“Não, dizemos no geral.”

Insisto: mas as gravadoras são um pouco brutais, não?

Resposta: “E nós somos ainda mais brutos. Demos muito mais tapas do que levamos".

Está bem, mas nunca houve uma sugestão ou qualquer tentativa de colocar as mãos no “produto Måneskin”?

“Eles tentaram nos primeiros cinco minutos. Depois, quando viram que estávamos nos saindo bem, nos deixaram à vontade”.

O resultado é um álbum totalmente Måneskin, em que também há uma mensagem: “A liberdade de expressão. É um convite a expressar a si mesmo, a ser criativo, a encontrar o próprio potencial e ser cada vez melhor”


A essa mensagem, eles também deram um rosto e um nome, Marlena – que, na verdade, aparece em várias músicas do disco. Em um certo ponto, no single “Torna a casa” (que estreou em primeiro lugar nas tabelas), Marlena não se encontra mais e Damiano pede para que ela volte.

Quando ela [Marlena] chegou?

“Na minha vida, quando eu tinha 16-17 anos”, explica o cantor, que também é o autor de todas as músicas. “Antes eu era completamente uma outra pessoa. Eu era muito fechado, estava sempre na minha. Até fisicamente eu era diferente: cabelos curtos, nenhuma tatuagem, nada de brincos, camiseta larga. Eu vivia para me fazer ser aceito, para contentar os outros. Depois eu entendi que eu só devo satisfazer a mim mesmo. Eu os conheci, nasceu o Måneskin, que me fizeram dar um grande ‘upgrade’ pessoal. Eu entendi que podia me expressar, e quando se faz isso os outros te apreciam ainda mais – porque enxergam você por quem você é”

Hoje Damiano realmente pratica a liberdade de expressão sem nenhuma vergonha, misturando apelo sexual e provocação. Direto do Pole Dance disruptivo no The X-Factor de salto alto e meia arrastão que, em alguns minutos, o transformou em um sex symbol ultra geracional – um grande culto que passa da juventude e chega aos cinquenta anos.

“Eu estou muito confortável com meu corpo e minha sexualidade, e gosto muito de me exibir”, confirma.

Faz muito sucesso com mulheres?

“É o que dizem”

Victoria, Ethan e Thomas concordam.

Risadas, olhares de entendimento.

“Até com mulheres mais velhas?” Mais risadas, Victoria se lembra do caso de um amigo de sua tia pelo qual tinha uma queda.

“Mas ele gosta de jovens ou mais maduras?”, nessa parte Damiano se explica em partes:

Eu gosto de todas”, e em seguida: “"De qualquer forma, agora noto uma coisa estranha: algumas tentam com um certo medo porque eu sou famoso, outras são apenas hardcore... cartas, mão na bunda, mensagens ultra explícitas”.

E agora os outros três riem mais alto: Sim, a mão boba é uma experiência pela qual os quatro passaram, ainda mais nas sessões de autógrafos.

Com essa vida de estrela do rock – estrelas do rock, mas ainda vivem com seus pais (“ainda somos menores de idade e, de qualquer forma, nunca estamos em casa”) - a escola passou para o segundo plano. Damiano deixou o ensino médio linguístico, os outros três estudavam em escolas particulares (Victoria no liceu linguístico, Ethan - artístico, Thomas - Científico), e eles estão ansiosos para terminar “mas não para agradar a nossos pais, é por nós mesmos”.

Sim, os pais.


Victoria, do bairro de Velho Monteverde, recentemente perdeu a mãe, o pai é agente de viagens. E de música, para a grande perplexidade da filha, ele não entende nada.

Thomas, de Nova Monteverde, é filho de dois assistentes sociais que trabalham em uma cooperativa que lida com órfãos, o pai dele também tem um passado de jornalista musical para a revista Metal Shock.

Ethan, o mais silencioso, tem a história familiar mais curiosa: a família dele é extensa e ele tem oito irmãs, dos quais compreensivelmente se esforça para lembrar as idades, e outro irmãozinho está chegando. O pai é um diretor de documentários, e sua mãe fica em casa. Eles vivem em uma vila de uma cidade na província de Frosinone, com 150 pessoas ao todo.

“Das quais metade são irmãos de Ethan”, brincam os outros.

Damiano, do bairro de Bravetta do Sul de Roma, é filho de dois assistentes de vooe tem um irmão mais velho que estuda Agricultura.

“Como os pais lidaram com essa escolha de abandonar os estudos?”

“Bem, eles entenderam que esse é o meu jeito”

Mas você foi rejeitado duas vezes, nem mesmo um remorso? Uma repreensão?

“Sim, no começo eles me repreenderam muito”, admite. “Mas depois eles viram o esforço que temos e que eu ponho e eles pensaram ‘uau’”.

O compromisso e esforço, para os Måneskin, é um tema recorrente: tocando, ensaiando muito e cuidando de todos os detalhes. E também está ligada à disciplina quase militar que Damiano impôs à banda, com regras muito distantes daquelas que você imagina quando pensa em quatro músicos de rock entre 17 e 19 anos.


“Por exemplo, devemos comer apenas coisas saudáveis”, diz Victoria, resignada, mas confessa: “Algumas vezes me escondi no quarto para comer batatas fritas”.

Sem álcool.

“Eu parei”, diz Damiano

Cigarros sim. Drogas não. Nada de festar até tarde da noite. Dormir um número adequado de horas.

Mas sempre tão duros, nunca tem uma diversão?

Damiano fica sério: “É uma questão de respeito com o nosso público”.

Victoria, mais libertária, faz uma distinção: “Mas durante as turnês de autógrafos relaxamos muito mais”

Relaxados, por outro lado, não são nem um pouco quando o assunto é política.

“Vocês gostam do governo, não gostam?”

“Não estamos na posição de julgar”, dizem um de cada vez

“Mas são de esquerda ou de direita?”

“Não tomamos uma posição ainda, somos apenas músicos”


Não tem jeito. Não vamos falar com eles sobre renda de cidadania, pensões, coisas com impacto no futuro dos jovens.


“Nós nos expressamos apenas através da música”


“Mas, pelo menos os maiores de idade, votam?”

“Só da última vez que não foi possível, estávamos em turnê”.

E muito “O voto é secreto”.

Nada. Então, daremos os votos para os grandes nomes da música italiana.

Vasco: “Número um, um semideus”

Ligabue “Um grande. Talvez não sejamos os maiores fãs, mas ele está no palco a 30 anos, uau”

Sobre Jovanotti: “Adoramos ele”, mas também há uma pequena história: a mãe do Damiano frequentou a escola com ele, e era meio apaixonada pelo músico.

A reunião está prestes a terminar, pergunto se eles estão com medo de que todo esse sucesso possa desaparecer de repente – assim como ele apareceu.

“Não, absolutamente não faz sentido ter medo agora: toda nossa vida estivemos prontos para esse momento”, diz Victoria com convicção.

E para onde vocês querem ir?

Damiano: “Queremos deixar um grande sinal, só um sinal não é suficiente para nós. Nós queremos nos tornar imortais com a nossa música”.

Então, com uma vozinha fina diz “Para o infinito e além”.

Todos riem. “É uma citação: é Toy Story!”




 

Tradução: Juliana Galvão | Portal Måneskin Brasil © 2022

Original: Valentina Colosimo | Vanity Fair Italia © 2018


Todos os direitos reservados a Vanity Fair Italia

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